quarta-feira, 2 de março de 2011

São Paulo, 12 de agosto de 1987.

Querida mãe, querido pai,
Não sei mais conviver com as pessoas. Tenho medo de uma casa cheia de pais e mães e irmãos e sobrinhos e cunhados e cunhadas. Tenho vivido tão só durante tantos – quase 40 – anos. Devo estar acostumado.

Dormir 24 horas foi a maneira mais delicada que encontrei de não perturbar o equilíbrio de vocês – que é muito delicado. E também de não perturbar o meu próprio equilíbrio – que é tão ou mais delicado.
Estou me transformando aos poucos num ser humano meio viciado em solidão. E que só sabe escrever. Não sei mais falar, abraçar, dar beijos, dizer coisas aparentemente simples como “eu gosto de você”. Gosto de mim. Acho que é o destino dos escritores. E tenho pensado que, mais do que qualquer outra coisa, sou um escritor. Uma pessoa que escreve sobre a vida – como quem olha de uma janela – mas não consegue vivê-la.

Amo vocês como quem escreve para uma ficção: sem conseguir dizer nem mostrar isso. O que sobra é o áspero do gesto, a secura da palavra. Por trás disso, há muito amor. Amor louco – todas as pessoas são loucas, inclusive nós; amor encabulado – nós, da fronteira com a Argentina, somos especialmente encabulados. Mas amor de verdade. Perdoem o silêncio, o sono, a rispidez, a solidão. Está ficando tarde, e eu tenho medo de ter desaprendido o jeito. É muito difícil ficar adulto.

Amo vocês, seu filho,
Caio.

8 comentários:

Cynthia Brito disse...

Olá Lih.
Vim avisar que tem selinho para você em meu blog. Beijinhos, minha flor. Não esqueça de passar lá para buscá-lo :)

Com amor,
Cynthia =*

Camila Cussate disse...

Me identifiquei demais com essa carta, concordo que infelizmente o destino de um escritor é a solidão mesmo...

to seguindo o blog!

Jéssica Karoline de Lara disse...

Ah, essa carta é a melhor... Fico triste lendo, mas é tão forte...

Amado Caio...

Sábias escolhas!

Beijo

Jéssica Karoline de Lara disse...

Ah, essa carta me deixa triste... Mas mesmo assim, eu adoro!

Amado Caio...

Sábias escolhas!


beijão!

Karina Monteiro disse...

Oi Lih, estou passando para agradecer a sua participação no sorteio do meu blog.
Beijos.

D.M Oliveira . disse...

Muito bom aqui !
estou seguindo .
beijos

Maria Cruz disse...

Nossa, me identifiquei completamente com o texto...

"Uma pessoa que escreve sobre a vida – como quem olha de uma janela – mas não consegue vivê-la."

Parece controverso mas é o que acontece comigo...Tenho muito amor, muitos sentimentos bons dentro de mim, ajudo todos meus amigos a superarem seus problemas, mas não consigo viver minha vida, não consigo fazer o mesmo por mim...Demonstrar claramente que gosto, etc...
Só quem passa por isso sabe como é... :(

Bj*
Seu blog eh ótimo!
;)

AugustoCrowley disse...

Verdade,o escritor fala com o mundo de forma diferente.Sente a presença do outro na mente, fala com as palavras, mas fisicamente precisa se isolar pra sentir de forma original.